BASTIDORES LITERÁRIOS – POR QUE O AUTOR NACIONAL É TÃO DESPREZADO?


Por Gianpaolo Celli, consultor do ALITERAÇÃO SERVIÇOS EDITORIAIS

Um dos assuntos que vira e mexe retornam a baila é o preconceito existente em relação ao escritor e ao livro nacional, em especial na literatura de gênero, como a fantasia, o policial e a ficção científica. O interessante é que apesar de existir e não ser pequeno, os argumentos por trás deste preconceito geralmente são muito fracos. Isso, pois tem como base colocações como “li um e era ruim” (como se uma experiência fosse o bastante para geral um ponto de vista imparcial), “não li e não gostei” (FALA SÉRIO! Esse não vale nem comentar) ou que o escritor nacional ‘lê pouco’ e que não é ‘antenado’ com o que está acontecendo no mercado, apresentando assim personagens estereotipados e histórias cheias de clichês.

Como eu creio que não é necessário discutir as duas primeiras colocações, vamos analisar última: Dizer que “o escritor nacional ‘lê pouco’ e que não é ‘antenado’ com o que está acontecendo no mercado” é uma generalização e como tal ela já é passível de erro (na verdade como todo preconceito), sobra então os “personagens estereotipados e histórias cheias de clichês”.

Isso é mentira? Não… Ou pelo menos não necessariamente. Como editor eu já e publiquei histórias boas e inovadoras, assim como aqui no Aliteração analisei histórias que eram boas, assim como as com clichês e personagens estereotipados.

Agora FALA SÉRIO! Se isso é um problema, não é só dos escritores nacionais, ou dos escritores que estão tentando se tornar profissionais no mercado nacional.

Recentemente eu acabei uma obra de Steampunk, gênero que não só gosto como escrevo e, ao guardá-lo em minha estante percebi que dos livros que li nos últimos meses quatro títulos, apesar de publicados no exterior e aqui no Brasil, possuem exatamente estas duas características.

Esse primeiro em questão é uma aventura Steampunk que conta a história de uma personagem que, para fazer algo que não poderia como mulher, se apresenta como do sexo oposto.

Não preciso dizer que este tipo de trama só não é mais clichê porque não dá, não é verdade? É só perceber quantos filmes (eu não vou nem comentar livros) existem que trabalham a ideia, como Ela é o cara, Shakespeare Apaixonado ou o desenho Mulan. E para não dizer que isso é coisa nova, o manga ‘A Princesa e o Cavaleiro’, de 1953, de mais de meio século, já trabalhava essa ideia.

Isso sem contar que a trama apresenta todos os clichês do gênero, como homens e mulheres se apaixonando pela personagem principal, alguém descobrindo seu segredo e usando isso… Em suma, são tantos clichês e estereótipos que já no meio da história já dá para se ter certeza do que acontecerá no fim. E FALA SÉRIO! Mesmo não tendo nada pior do que isso, o livro não só foi publicado lá fora, como foi traduzido e publicado aqui.

Outro livro, também do gênero Steampunk, mas desta vez com zumbis, não convence nem como aventura e tampouco como terror. Tudo bem que eu não me sinto particularmente atraído por tramas de zumbis, mas a impressão que dá é que o autor viu um monte de fotos de cosplay na internet, inventou uma trama que seria interessante num conto, mas resolveu mandar a verossimilhança para o espaço tentando escrever um romance com um argumento que não tinha força para tanto.

O mesmo aconteceu com os dois outros livros, ambos spin-offs literários de uma grande franquia cinematográfica. O primeiro uma aventura com zumbis. Agora, se você imaginou que esse tipo de trama numa space opera se tornaria um suspense como Alien o oitavo passageiro, pode esquecer. Como na história com zumbis mencionada acima, o livro, ao menos para mim, não convenceu como aventura e tampouco como terror. Uma vez mais uma ideia interessante para no máximo uma noveleta, mas definitivamente não para um romance, ao menos não como foi desenvolvida.
O último dos quatro (e novamente relembro: publicações internacionais traduzidas e lançadas aqui) é um romance que tem como ponto de venda dar dicas para os novos filmes da série da qual é spin-off. Como já comentado anteriormente: não só não entrega o que prometeu como também apresenta uma trama batida e cheia de clichês. E FALA SÉRIO! Aqui é pior, pois a mesma não é muito mais do que um Romeu e Julieta espacial.

Mas Por que eu estou dando estes livros como exemplo? Você pode estar se perguntando.

Porque como vimos acima, é basicamente esse o preconceito apresentado em relação ao livro e ao escritor nacional, que apresenta personagens estereotipados e histórias cheias de clichês.

O problema é que toda essa crítica não tem absolutamente nada a ver. FALA SÉRIO! Todos os livros acima mencionados têm exatamente esses problemas e foram escolhidos não só por profissionais das grandes editoras nacionais como também das internacionais.

Qual é o problema do autor nacional, então?

A questão na realidade é bem mais básica. Isso, pois todos os exemplos acima, apesar da crítica são bem escritos, com bons diálogos e descrições de cenas convincentes e é isso que muitas vezes falha no livro nacional.

Não adianta ter uma ideia muitas vezes genial e terminar com ela por não conseguir apresentar sequencias de cenas boas. Isso sem contar usar artimanhas que chamem a atenção do leitor, assim como dos profissionais das editoras. Como eu já disse: “escrever e escrever profissionalmente são duas coisas tão distintas quanto dirigir e pilotar profissionalmente.”

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4 Comments

  1. 08/05/2017

    Oi Dan,

    Então, sobre essa questão de todas as histórias se encaixarem em sete perfis, o assunto é interessante e o número depende da corrente que você segue. Assim como o mitólogo Joseph Campbell, por exemplo, dizia que todas se encaixam na Jornada do Herói, existem estudiosos que determinam os perfis como 3, a Jornada do Herói, o Rapto da Donzela e o Trickster.

    Mesmo assim o fato destas estruturas existirem pouco tem a ver com clichês. Eu concordo, como o próprio Campbell colocou, de que todas as histórias já foram contadas, mesmo assim isso não quer dizer que todas elas tenham sido ouvidas, afinal de contas a humanidade existe a milhares de anos e ninguém conhece efetivamente as histórias de todo este tempo. E mesmo que as estruturas sejam as mesmas, sejam elas 7, 3 ou uma, cada personagem é diferente e reagirá a cada uma delas de uma maneira diferente, de modo que, como você disse, é possível contar uma história que cative, mesmo que não completamente inédita, cative

    Finalmente eu concordo com sua colocação de que há coisas boas e ruins sendo publicadas tanto aqui como lá fora. Na verdade, como estava conversando a respeito com outro profissional da área que não só há histórias ruins publicadas lá fora que desconhecemos exatamente porque por não possuírem um padrão internacional terminam não sendo publicadas aqui, como existem aquelas que mesmo sendo traduzidas e publicadas aqui são ruins. Afinal de contas, como eu já coloquei em artigos anteriores, o que as editoras nacionais procuram num livro internacional não necessariamente é a qualidade, mas simplesmente ele ser um best-selller e não as duas coisas não precisam andar juntas.

    Abraços,

  2. Ouvi falar que todas as histórias de mundo se encaixam em um de sete perfis possíveis. Buscar o ineditismo se torna cada vez mais difícil, por isso não tenho nada contra os clichês. É o uso deles de forma boa ou ruim pelos autores e autoras que determina uma boa história ou não.

    Deixar de ler os nacionais é uma bobagem, afinal há coisas boas e ruins tanto aqui quanto lá fora.

    Abraços!

  3. 23/04/2017

    Oi Helena,
    Antes de qualquer coisa, obrigado pelo elogio. Sobre a questão, e eu estava discutindo a mesma dia destes com uns amigos, é que como eu sempre digo sobre o assunto “Escrever é tão diferente de escrever profissionalmente quanto dirigir um carro é de pilotar um Formula 1”. As noções básicas são as mesmas, mas o treino faz toda a diferença.
    Abraços,
    Gian

  4. 19/04/2017

    Parabéns! Concordo com sua conclusão. Infelizmente no mercado nacional pouco valor damos para as técnicas literárias, como se somente a inspiração fosse suficiente para estruturar uma cena, deixar um diálogo convidativo, ou ser suficiente para sustentar a narrativa e fazer o leitor ficar colado a trama. Depois que estudamos e conhecemos estas regrinhas, facilmente conseguimos identificá-las nos best sellers que chegam ao nosso país e estão na linha de frente das editoras. Escritor que é escritor está em constante aperfeiçoamento.
    Abraços e sucesso pra ti.
    Helena

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