Por Gianpaolo Celli, consultor do ALITERAÇÃO SERVIÇOS EDITORIAIS
Essa analise já deveria ter saído há algum tempo, mas com todo o trabalho que está chegando eu terminei deixando-a para agora. De qualquer modo, para quem não se lembra, no início de dezembro de 2016 saiu um artigo no Publishnews chamado ‘A Cabeça do Editor do Século 21: Cadê o Glamour?’, cujo objetivo era desmistificar o lado glamoroso, a visão romântica da função do editor.
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Nele se dizia que o editor atual não tem uma vida glamorosa, buscando em parceria com os escritores conseguir um produto sublime de arte, e que a maioria dos editores deve se orientar “pelos quatro Ps do Marketing: produto, preço, promoção e praça”.
FALA SÉRIO! Eu até concordo que “não há espaço para o gosto pessoal” e que “as tendências ditam muitas das ações editoriais”. Na verdade como editor eu mesmo já publiquei livros que, apesar da qualidade, não eram do meu gosto pessoal. É lógico! Eu estava publicando não só pra mim, mas para o outros tipos de leitor, também. E mesmo para escritores, quando faço palestras e cursos eu comento que se sim, Le deve escrever sobre o que gosta, também deve se focar num público alvo, mas como já coloquei mais de uma vez aqui, um editor deve, ou deveria ser mais do que um simples comprador de best-sellers que não consegue perceber a necessidade de um mercado ou a possibilidade latente de um original.
Inclusive, é interessante que numa parte o artigo comente que “não há espaço para o cuidado meticuloso com a tipologia ou com o tipo de acabamento” e que se perder o pudor de chamar o livro de produto – FALA SÉRIO! Eu mesmo já falo isso, não só como editor, mas como escritor, há mais de uma década: “escrever é uma arte, mas livro é um produto.” – mas depois diga que o editor deve ter em mente questões como: Qual o público alvo? Quais os produtos concorrentes e como foram de vendas? Quais os números no exterior? Em que linha do nosso catálogo entra? Como está o autor nas redes sociais? Quanto esperamos vender?
Fora que já na primeira questão já englobe elementos como capa e “o tipo de acabamento” de modo a chamar a atenção de um dado “público alvo”. Na verdade o artigo mesmo afirma isso ao “O produto precisa sair, entre outras coisas, com uma capa que se comunique com os seus consumidores, que chame atenção nas lojas.” Ou seja… Ups!
Isso sem contar que no próprio Publishnews há algum tempo saiu a colocação de um editor que dizia que elementos como linha de catálogo era algo que a maioria os leitores ignora, já matando a mais do que importante quarta questão.
Sobre outras perguntas da lista, como ‘Quais os produtos concorrentes e como foram de vendas?’ e ‘Quais os números no exterior?’, eu gostaria de propor um estudo de caso.
Recentemente tivemos um boom no mercado editorial de distopias, várias das quais foram adaptadas para o cinema, inclusive. Imagine então a posição de um editor, como o mencionado acima, que não ligue para a história, só para produtos concorrentes, vendas e números no exterior. Tudo bem que aqui no Brasil a Rocco comprou os direitos tanto de Jogos Vorazes, como de Divergente, as duas principais franquias do gênero, ficando o Maze Runner com a V&R Editoras e O Doador de Memórias com a Arqueiro.
Será que todas tiveram o sucesso esperado?
Quer dizer, mesmo a série Divergente, no cinema, perdeu parte de sua força no final. Os dois demais então, nem vale a pena comentar. O mesmo se viu nas livrarias, em que havia pilhas e pilhas de dos títulos da Rocco e a presença dos demais foi apagada. O que será que faltou? Será que o editor deveria, ao contrário do que o artigo afirma, se ter perguntado o título? Cuidado um pouco mais dos detalhes, ao invés de tratar o livro como “um número, ou melhor, uma cifra na linha de produção”?
Outro caso que eu gostaria de analisar a luz de tais questões, em especial porque é nesse ano que caíram em domínio público clássicos da Ficção Científica como O homem invisível (1897), A ilha do Dr. Moreau e A guerra dos mundos (1898), é: o que diabos estes editores “frios e calculistas” estavam pensando em 2015 quando inundaram o mercado com cópias e mais cópias de O Pequeno Príncipe? Tanto que atualmente se acham as mesmas a preço de banana nas máquinas de metrô?
Quer dizer, será que os editores não pensaram no “público alvo”? Nos “produtos concorrentes e como foram de vendas”? Em quais foram “os números no exterior”? E pior: o quanto “esperamos vender”?
Porque FALA SÉRIO! Qualquer um com meio cérebro poderia prever que os leitores não iriam começar a comprar versões diferentes de um livro infantil publicado originalmente em 1943 só porque o autor entrou em domínio público!
Quanto a questão de “Como está o autor nas redes sociais?” Não vou nem comentar, pois já discorri a respeito no final de 2014 no artigo QUAL O VALOR DE UMA CURTIDA?, em que discorri a respeito de como se pode comprar curtidas e criar uma imagem falsa de si mesmo nas redes sociais.
FALA SÉRIO! Parece que esses editores, apesar de frios e calculistas, ainda não perceberam isso.
De qualquer modo eu gostaria de concluir com alguns questionamentos:
1) Será que estes “editores” conseguiriam ser tão analíticos e eficientes se, ao invés de comprar um best-seller já com todas as respostas prontas, eles tivessem de pegar o original de um escritor desconhecido do zero e fazer dele um sucesso?
2) Será que eles conseguiriam apostar na primeira obra de uma autora como J.K. Rowling, por exemplo, mas não após estourar e virar um sucesso do cinema?
3) Ou será que a editora deles, como muitas antes da obra ser aceita ser aceita pela Bloomsburry, recusariam, como fazem com os originais de inúmeros desconhecidos que diariamente chegam às editoras sem dados como “números no exterior” ou quantos se espera vender?
E finalmente, FALA SÉRIO! Será que alguém assim pode mesmo se dizer um editor?
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