Semana passada eu estava comentando a respeito de uma conversa que tive com outros profissionais do mercado e de como ela descambou depois de algum tempo numa discussão sobre como algumas ditas técnicas que garantiam “prender” o leitor na verdade não passavam de clichês, ou fabricas de clichês nas mãos de escritores com menos experiência.
Após falarmos das receitas de Jornada do Herói, da famigerada Contagem Regressiva e dos Ganchos ou Cliffhangers, foi a vez de se lembrarem dos Pontos de Virada, ou Plot Points. Vindos da indústria cinematográfica, essa receita comenta que cada história deve ter ao menos dois pontos de virada, de modo a não ficarem chatas. A história começa com a quebra do cotidiano do(s) protagonista(s) que começa(m) a tentar resolver o problema para retornar o status quo. Dividindo o primeiro terço da trama do segundo, ele, ela ou eles conseguem algum sucesso e a história começa a virar, até que, dividindo o segundo e o terceiro terço da história, acontece um novo Plot Point que novamente bota o(s) protagonista(s) numa fria até que eles possam resolver o problema de maneira definitiva. A questão aqui é que se você fizer isso sempre e o leitor conseguir descobrir a fórmula, a técnica se volta contra você. Quer dizer, sabendo que sempre haverá um Ponto de Virada entre primeiro e o segundo e entre este e o terceiro terços da história, você sempre chegará a conclusão de que este incidente ou evento que reverte a ação e a joga em outra direção na verdade é uma ilusão, pois o primeiro Plot Point sempre levará os protagonistas para o lado errado e que eles só encontraram a resposta no segundo Ponto de Virada a história. É que nem assistir a uma mágica que você sabe como acontecerá. O mágico mostra que a cartola está vazia, mas tira um pombo que está guardado um fundo falso. FALA SÉRIO! Onde está a surpresa? Qual é a graça disso?
Inclusive, foi como um livro que li (um dos piores). O autor deve ter lido em algum lugar que a melhor maneira de prender a atenção do leitor desde início da história é começar a contá-la do meio. Daí ele fez o que? Simplesmente pegou um capítulo do meio e jogou no começo. Sem explicações, sem ligação com nada a seguir, simplesmente colocou ali. Depois continuando a história de onde ela cronologicamente começava. Em me recordo que li aquela sequência de ação achando que ela continuaria e que ele usaria uma técnica semelhante a do gancho, que é mesclar a ação com lembranças, de modo que no fim das lembranças, normalmente no penúltimo capítulo o leitor descobre o porquê de a história ter começado, só para ler como ela terminará no capítulo seguinte, mas não. FALA SÉRIO! Ele simplesmente jogou aquele capítulo no começo, achando que prender a atenção do leitor no primeiro capítulo, mas perdê-la no segundo ou no terceiro capítulos não faria do livro um fracasso!
Assim que eu contei a história outra pessoa lembrou que uma das “técnicas” infalíveis apresentadas na discussão era a linearidade, pois segundo quem a defendia uma obra linear atrai mais os leitores. Segundo quem defendia essa dica, que incrivelmente ia contra outras apresentadas, como Cliffhangers ou mesmo intermediar a ação com memórias explicativas, ou mesclar a ação ou reação do protagonista com a ação ou reação do antagonista, mostrando ao mesmo tempo dois pontos de vista diferentes, como um jogo de xadrez, rupturas temporais podem causar estranhamos e exigem do leitor. FALA SÉRIO! Chamou o leitor de burro na cara dura!
A última técnica apresentada, e é interessante que eu mesmo a use aqui (o que é normal, tendo em vista que isso não é uma ficção), é a de criar Interatividade com o leitor. Como? Fazendo com que narrador dialogue com o leitor. Isso, segundo o defensor dessa técnica maravilhosa, criaria uma espécie intimidade, deixando assim o leitor à vontade com o texto e querendo continuar.
FALA SÉRIO! E isso é uma colocação que faço para você leitor, de modo a criar intimidade, sacou? (Essa é outra) O que segura uma história são personagens bem construídos, uma trama bem fundamenta e apresentada de maneira não óbvia, de modo a manter o leitor curioso. Cenas bem feitas e diálogos lógicos. O resto é mambo-jambo como dizem em inglês, uma bobagem sem sentido. Especialmente se, como eu já coloquei na conclusão da primeira parte do artigo, o escritor tentar usar a técnica sem dominá-la devidamente. Um exemplo disso na vida real é uma arma de fogo na mão de alguém que não sabe usar. Praticamente todos os especialistas de segurança concordam que ela termina sendo um perigo mais para que a possua do que para seu eventual antagonista, que termina tomando a arma e matando o dono. Então, se você não que isso aconteça com seu livro, com ele se voltando contra você, aprenda a usar essas técnicas milagrosas antes de tentar colocá-las no papel.
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